quarta-feira, 19 de setembro de 2007

PARÊNTESES

Naquelas tardes preguiçosas em que toda a rua parece dormir, me fiz caminhar pelos arredores dos casarios, em vielas (íngremes demais pro meu gosto) na velha Ouro Preto.
Nunca fui dado à ginásticas mirabolantes pra manter o corpinho (até porque até então ele tem se mantido sozinho), porém naquele momento o exercício de subir e descer ladeiras me trazia um prazer muito especial. Após o queijo com goiabada (Romeu e Julieta, eles chamam aqui) na cheirosa pensão de D. Domingas (Terças seria mais feminino) acendi o meu filtro branco ( menos nicotina e menos alcatrão) e inventei de ficar frente a frente (ou lado a lado) com o barroco mineiro.
Ouro Preto me mete medo, sempre penso estar pisando em túmulos (e isso é um grande desrespeito aos mortos) e, pisando em inconfidentes, me pus a fazer confidências que só eu podia ouvir. Me fiz amante, (e assim o estava) e tentei tecer reflexões sobre Lucia e as nuances bonitas do nosso amor.
Não era racional nem inteligível saber-me apaixonado, afinal homem de 40 que sou, possivelmente amadurecido e que se via sabedor das armadilhas do amor, mais uma vez adolescesse embaraçosamente.
Apaixonei-me pela voz de Lucia mais que o doce som, seda por assim dizer, são as formas que ela dá ao trivial, ao cotidiano, auras de magia. Ouví-la me seduz, e com isso a amo e este amor é real.
Somos correspondentes interplanetários, nascemos e vivemos em galáxias e dimensões diferentes, eu aqui, ela lá, eu mero homem, ela ninfa, Ninfa das Águas. Algo nos uniu, além de vozes, descubro hoje que a coisa do amor é bem mais simples e fácil que os devaneios dos novelistas. Pelas ruas de Ouro Preto, tenho e sinto amor, testemunhos barrocos não me deixaram dúvidas, ter Lucia é ser Lucia, e sua serena geografia me encanta como Marília enrubesceu Dirceu, Dorotéia enfeitiçou Tomaz, Joaquim enlouqueceu a corte e como a lua, que em suas posudas poses rococós apressa a chegada do sol, que em se fazendo inconfidente não consegue esconder seu brilho terno, quente e apaixonado.

Nenhum comentário:

Colaboradores


Confira

Cronicas de Abnegada Abgail
Fotografias do Mundo
Crônicas de dores passíveis
Crônicas de amores possíveis
Artigos da Revista Telas e Artes